Na semana passada, participamos do evento “Flash Humanidades 2023”, em São Paulo. Na ocasião, Ram Charan, renomado consultor de negócios e especialista em liderança com mais de quarenta anos de carreira, falou sobre o novo papel do CHRO e a subvalorização da posição dentro do C-Suite. Para o palestrante, embora as pessoas sejam as principais responsáveis pelo sucesso de toda e qualquer organização, a maior parte dos CEOs ainda considera a área de Recursos Humanos como secundária.
A percepção de que a função de RH é meramente operacional foi culturalmente construída ao longo dos anos. Folhas de pagamento, contratação, gestão de benefícios ou dinâmicas em grupo: as ações implementadas para atingir seus objetivos estratégicos acabaram por nublar suas potencialidades e transferi-las para o nível da mera execução. Entretanto, para modificar esse cenário, os CEOs precisam, mais do que nunca, “redefinir e elevar o papel do CHRO” (HBR), uma vez que, delegando tarefas administrativas para terceiros, será possível estruturar um setor pautado no planejamento a longo prazo.
O CMO é especialista em Marketing. O COO, em operações. O CTO, em tecnologia. O CHRO, por sua vez, é especialista em talentos. E, se são estes talentos o motor de suas companhias, por que a posição de Chief Human Resources Officer ainda encontra-se em desvantagem no mercado corporativo? Não há mais espaço para ignorar esse contexto. Suas contribuições podem ir desde a previsão de resultados, até o diagnóstico de problemas relacionados às pessoas (isto é, que podem estar prejudicando o desempenho grupal e impactando negativamente na lucratividade do negócio) e a prescrição de ações de geração de valor.
Para Ram Charan, as organizações não devem se preocupar apenas em gerar líderes, mas sim, na qualidade dos líderes que ocuparão posições de responsabilidade e destaque, bem como promoverão as mudanças necessárias. Nesse sentido, remodelar a função de Recursos Humanos significa investir no futuro da companhia através da verdadeira raiz da transformação. Em um movimento de reestruturação, os CEOs devem aproximar-se da área de pessoas e cultura e agir em conjunto a ela.
Na pesquisa “The changing face of HR in 2024”, realizada pela Sage Group, descobriu-se que cerca de 63% dos componentes do C-Level ainda veem o papel do RH sob uma perspectiva puramente administrativa e, embora quase soando como obviedade, essa ótica pode ser caracterizada como uma barreira para o sucesso do setor. Por isso, o momento de agir é agora.
A tendência é que as lideranças de RH centralizem seus esforços na elaboração de estratégias a longo prazo, que contemplem a conjuntura macro do negócio, sobretudo no que se refere à atração e retenção de pessoas-chave. Antes considerado um ator de apoio (ou seja, que poderia implementar decisões já tomadas por outras posições), com a reorganização oficial de suas atribuições, passará a desempenhar um papel central no processo de tomada de decisões.
Flash Humanidades 2023 | Palestra Ram Charan
Mas, diante disso, o que pode ser feito no curto prazo?
1. Diálogo e alinhamento de expectativas:
O CEO e o CHRO devem estar alinhados entre si. Assim, é imprescindível que a relação entre ambos seja pautada pelo diálogo. Com uma conversa clara, transparente e objetiva, será fácil compreender quais são os resultados desejados e quais ações devem ser executadas para alcançá-los.
2. Previsão de resultados:
Ainda para o guru de liderança Ram Charan, o CHRO deve ser capaz de avaliar as chances de atingir as metas do negócio através de sua atuação. Isso significa planejar, monitorar e avaliar a performance humana sob uma concepção estratégica, de maneira a compreender o que deve ser feito para potencializar e otimizar a produtividade. Esse processo compreende, por exemplo, a avaliação da sintonia das lideranças internas com as pressões e oportunidades externas, incluindo fatores como resiliência, adaptação e gerenciamento de riscos.
Além disso, atentar-se à concorrência é substancial. Para Dominic Barton, da Harvard Business Review, as previsões devem incluir o impacto provável de quaisquer modificações atreladas à área de RH em empresas adversárias, sejam elas:
- Modificações nos seus programas de incentivo;
- Aumento no volume de negócios;
- Aumento ou diminuição no volume de contratações;
- Demissões em massa;
- Contratação de conhecimentos especializados.
Com uma postura preditiva, será viável entender quais os movimentos de mercado mais assertivos, bem como avaliar quais serão os investimentos necessários para que as metas sejam alcançadas. E, talvez, esse seja o principal caminho para nos aproximarmos da valorização genuína da área de Recursos Humanos.
3. Diagnóstico do cenário:
Sem delongas, também é preciso voltar-se à análise do ambiente interno, examinando o sistema social da empresa (isto é, a forma como as pessoas trabalham em conjunto e interagem entre si). A partir disso, o CHRO poderá agir com base em dados efetivos e trazer ainda mais credibilidade para sua posição. Entendendo as idiossincrasias do ambiente interno e quais as suas maiores lacunas e qualidades, é possível decidir entre fornecer treinamentos mais adequados, realizar substituições, investir em capacitações ou reestruturar determinados setores.
Inclusive, um comportamento orientado a dados é cada vez mais perceptível nas áreas de RH. Para 2024, a tendência deve seguir em implementação, sobretudo com o fomento de uma cultura analítica em todos os setores das companhias em que atuam. Todavia, é necessário que o board esteja alinhado a essas mudanças e realize os investimentos necessários para colocá-las em prática. De acordo com uma pesquisa da Nederlands Expertisecentrum Vitaliteit, centro holandês especializado em mediação e análise com ênfase em vitalidade, a análise de dados encontra-se em terceiro lugar nas tendências esperadas para o próximo ano, e tornar esses dados acionáveis para as equipes, em quarto.
4. Ações de geração de valor:
Uma empresa é guiada pela lucratividade. Logo, os CHROs devem ter preparo suficiente para recomendar ações (relacionadas ao capital humano) que poderão gerar valor para o negócio e torná-lo ainda mais rentável.
“Embora a realocação de capital seja importante, a realocação de pessoas juntamente com a realocação de capital é o que realmente impulsiona as empresas”
Harvard Business Review
A pesquisa citada no começo deste artigo (Sage Group | 2024) traz à luz as áreas mais importantes nas quais as lideranças de RH esperam uma atuação mais proativa e, por consequência, serão elas as principais responsáveis por agregar valor à organização, seja no curto ou no longo prazo:
- Saúde e bem-estar dos funcionários;
- Gestão de talentos e planejamento da força de trabalho;
- Diversidade, Igualdade e Inclusão;
- Employee Experience;
- Qualificação/aperfeiçoamento da força de trabalho;
- Employer Branding;
- Cultura corporativa.
Por fim, pode-se compreender que a subvalorização do CHRO acontece por uma intensa distorção da realidade. O papel dessa liderança sempre foi estratégico, mas é percebido como operacional pelo board das organizações porque, muitas vezes, acaba posposto em relação às outras posições do C-Suite. Esse cenário, no entanto, tem um grande potencial para ser modificado.
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