Você e a sua empresa estão preparados para o processo de M&A?
Especialistas do setor prevêem que o final de 2020 será marcado por intensa movimentação de operações de M&A. Mas afinal, o que são essas operações? Quais são as etapas (milestones) envolvidas do começo ao fim do processo? Quem são os players? Qual a dinâmica e os cuidados a serem observados pelas empresas conduzindo um processo de M&A, especialmente as que estão em busca de investidores?
M&A é a sigla, em inglês, para Fusões e Aquisições (Mergers & Acquisitions) e é o termo geralmente utilizado para descrever a consolidação, total ou parcial, de empresas, unidades de negócios ou ativos.
Embora uma transação de M&A envolva, normalmente, apenas 4 importantes milestones: valuation, due diligence, signing e closing, o processo como um todo pode, facilmente, levar mais de 18 meses até sua conclusão.
Mas, antes de iniciar a longa jornada do processo de M&A, o empreendedor precisa fazer uma reflexão profunda e responder as seguintes questões: i) qual o propósito da operação, ii) qual o tipo de investidor que ela deseja prospectar, iii) ele está preparado para aceitar as mudanças que serão necessárias implementar?
Propósito da operação de M&A
As razões mais comuns citadas pelas empresas que entram numa operação de M&A são:
- Sinergia/ganho de escala – redução de custos fixos através da eliminação de estruturas que ficarão duplicadas como, por exemplo: diretorias, contabilidade, tesouraria, RH e demais áreas administrativas;
- Acelerar o crescimento – a operação de M&A é, normalmente, a alternativa escolhida quando a empresa deseja adquirir market share ou acelerar o crescimento da sua receita sem ter que esperar o tempo necessário para a implantação e maturação de um projeto green field que depende da obtenção de licenças, construção e instalação de equipamentos, treinamento dos funcionários, etc;
- Cross-Selling – atender os clientes atuais com produtos ou serviços complementares aos existentes;
- Diversificação/redução de possível concentração – acessar novos mercados, clientes, canais de distribuição ou fornecedores e, assim, reduzir os riscos decorrentes de alguma possível concentração;
- Integração vertical – a empresa visualiza benefícios em avançar/retroceder na cadeia de produção da indústria, a fim de capturar valor produzido pelo fornecedor ou cliente. Aqui cabe uma ressalva no caso específico de a empresa resolver avançar na cadeia adquirindo um cliente – a mesma deve levar em consideração o impacto negativo decorrente de um possível boicote dos clientes atuais que passarão a ser, também, concorrentes.
- Acesso à tecnologia / recursos / governança / mão de obra especializada (AKA acqui-hiring) – no processo normal de crescimento as empresas podem decidir por buscar sócios que aportem recursos, tecnologia e/ou mão de obra especializada, bem como auxiliem no processo de profissionalização e desenvolvimento/fortalecimento das estruturas e processos de governança corporativa.
Aqui vale uma ressalva em relação aos empreendedores que estão buscando investidores e cujo propósito, de fato, é apenas capitalizar a empresa, melhorar a sua estrutura de capital e, consequentemente, reduzir a despesa financeira. Entrar em uma operação de M&A com problema de liquidez é a pior estratégia possível – por melhor que sejam as intenções do potencial investidor, ele sabe que o tempo está a seu favor e que, à medida que a operação for se alongando, mais flexível (ou desesperado) estará o empreendedor para negociar valor e termos da transação.
Tipos de Investidores para as operações de M&A
Em relação ao tipo de investidor, o empreendedor deve decidir se faz mais sentido buscar um parceiro estratégico ou financeiro.
O investidor estratégico é, normalmente, uma companhia que já opera na mesma indústria, ou indústria adjacente, e que busca na aquisição total ou parcial os benefícios acima descritos, tais como: sinergias, crescimento, diversificação, etc. Assim, por conta desses benefícios, a companhia estará disposta a pagar um valor maior pela participação, bem como em aportar não só recursos financeiros, como também tecnologia, gestão, regras de governança, compliance e acesso a fornecedores globais e canais de distribuição; além de participar ativamente na discussão do planejamento estratégico.
Por fim, o investidor estratégico geralmente busca adquirir o controle da empresa ou, pelo menos, tenta negociar a inclusão dessa opção no contrato de investimento, pois vê a aquisição da como parte do seu planejamento de longo prazo. Portanto, sem data de saída.
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Por sua vez, o investidor financeiro analisa a operação de M&A como se fosse uma transação financeira – com taxa de retorno estimada em razão do valor a ser investido, dos fluxos de caixa futuros projetados e da data de saída pré-estabelecida. Em relação ao suporte adicional à capitalização, o investidor financeiro, na maioria das vezes, também irá contribuir no processo de profissionalização da empresa, fortalecer a gestão e melhorar as estruturas e os processos de governança corporativa, sempre visando impactar positivamente os fluxos de caixa futuros da empresa e, assim, aumentar o retorno esperado da transação.
Em outras palavras, pode-se dizer que a estratégia do investidor financeiro é adquirir uma participação (ou a totalidade) da empresa pelo menor valor possível, escalar a operação, torná-la mais eficiente e, após 5 a 7 anos, sair do investimento através da venda da participação para outro investidor (normalmente estratégico) ou via IPO. E, é em razão dessa estratégia de saída via IPO que muitos empreendedores consideram a entrada de um investidor financeiro (ex. private equity firm) como sendo uma etapa na preparação da empresa para a abertura de capital.
O empreendedor está preparado para aceitar as mudanças que são necessárias para o processo de M&A?
Mesmo antes de definir o propósito da operação e o tipo de investidor que melhor se adequa à estratégia da empresa, é crucial que o empreendedor faça uma reflexão profunda e tenha claro as mudanças que ocorrerão por conta da entrada de um novo sócio, em especial, em relação ao seu papel no dia-a-dia da empresa.
Este é um item crítico, pois envolve poder e mudanças do status quo, e é aqui onde, normalmente, a transação.emperra ou, uma vez concretizada, inicia a deterioração no relacionamento entre os acionistas. Portanto, antes de iniciar o processo de M&A, é extremamente importante que o empreendedor entenda.as consequências (dores) do crescimento e as mudanças que serão necessárias implementar para continuar crescendo de forma sustentável.
A maioria dos empreendedores inicia a sua empresa com pouco capital, estrutura enxuta e processos completamente dependentes do seu bom senso. Afinal, ninguém sai implantando um ERP e/ou um organograma com gerentes e diretores para abrir um “pequeno negócio no bairro”. A empresa, nesse estágio, é praticamente só o empreendedor, e assim deve ser. Contudo, à medida que a empresa cresce e, por exemplo, necessita buscar recursos de terceiros, algumas alterações precisam.ser efetuadas para que ela possa captar recursos.“on a stand alone basis”, isto é, com base no seu desempenho econômico financeiro, e não, em garantias.
Para atingir essa fase, a empresa precisa implantar novos processos e regras de governança – os bancos, por exemplo, vão exigir.demonstrativos financeiros auditados que, por sua vez, precisam ser gerados em um sistema ERP robusto.e confiável para que a auditoria possa dar um parecer “limpo”. Isto não quer dizer que a maneira como a empresa sempre foi gerida estava errada. Isto quer dizer, apenas, que para passar da “infância” para a “adolescência”, a empresa/empreendedor.precisará mudar sua atitude e a forma como se relaciona com seus credores e demais stakeholders. Fornecer disclosure deixa de ser uma opção e passa a ser obrigação.
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Essas mudanças, contudo, são ainda muito mais drásticas quando, nesse processo.de crescimento, o empreendedor passa a delegar a um executivo a gestão da empresa ou resolve buscar sócios externos. Nessas duas situações, pode surgir aquilo que a literatura chama de conflito de agência (Jensen & Meckling, 1976).
Resumidamente, a teoria da agência afirma que o agente responsável pela tomada de decisão, seja ele o acionista controlador ou executivo, nem sempre tomará a melhor decisão em prol da empresa e de todos os acionistas.
Neste sentido, e a fim de reduzir esses conflitos, alinhando os interesses do agente com os do proprietário, a empresa terá que.assumir custos, fortalecendo regras e estruturas de governança corporativa, tais como: implantação de conselho de administração, auditoria, controles internos, código de conduta & ética, etc. Os quais, infelizmente, na maioria das vezes, são vistos como aumento de burocracia e perda de poder por parte do empreendedor.
Afinal, até então, o empreendedor tomava as decisões sozinho e não precisava dar satisfação dos seus atos a ninguém. Aqui, novamente, as mudanças não significam que tudo que foi feito até então estava errado. Elas, as mudanças, são apenas parte (dores) do crescimento. O empreendedor sempre pode optar por não mudar, mas, dificilmente, continuará crescendo e atraindo investidores.
Enfim, esse é o grande dilema que o empreendedor deve responder antes de iniciar um processo.de M&A: “desejo manter o poder e o status quo, deixando a empresa do jeito que está, afinal eu sou o dono; ou pensar na continuidade da empresa, buscando parceiros e adequando os processos e estruturas de governança para atrai-los e permitir o crescimento sustentável da mesma”?
Uma vez respondido o dilema acima de forma honesta consigo mesmo, o empreendedor estará apto a avançar através das etapas do processo de M&A, que veremos a seguir.
Autor Jorge Zanette: Executivo financeiro com mais de trinta anos de experiência que mesclam conhecimentos adquiridos na gestão estratégica e financeira de empresas nacionais, com controle familiar, e na administração de crédito de instituições financeiras multinacionais. Conduziu, como CFO, o processo de M&A de duas importantes empresas gaúchas que resultou na entrada de um fundo de investimento e de um investidor estratégico.